Pular para o conteúdo principal

NÃO DETURPEM O PAPAI NOEL

 


No último sábado, estive em uma festa de natal de um clube de Porto Alegre. Dedicada especialmente às crianças, o evento contou com a presença do Papai Noel. Ao chegar, a criançada correu para abraçá-lo, mas ele apenas seguiu adiante, rumo ao palco montado no pátio do lugar. Ele subiu e, como uma estrela de rock, ergueu suas mãos para alto, celebrando a si mesmo. Achei estranho.

 Em seguida, ele desceu e caminhou até a clássica poltrona. Considerando a fila gigante de crianças que se formou, e ante a informação de que o velhinho ficaria lá por “horas”, convenci minha filha a irmos mais tarde.

 Cerca de uma hora depois, vi que a fila estava desfeita. Corri para chamar minha filha. Quando voltei, Papai Noel dançava alucinadamente com os adultos. Sorria de uma maneira insana, como se fosse a estrela da tarde. Abraçava homens e mulheres calorosamente, enquanto as crianças, ao seu redor, observavam-no visivelmente constrangidas, afinal, não era aquela a imagem do barbudinho que tinham em seus corações.

 Mesmo assim, chamei Papai Noel para umas fotos. Ele ergueu minha filha como se ela fosse uma mochila, sacudiu-a e abraçou-a. Ela não gostou. Sua alegria foi abafada pela estranheza daquela atitude. As fotos ficaram horríveis, mas educadamente agradeci. Ele me respondeu, gritando e gargalhando em meio ao som alto e apontando para o próprio corpo: “Já viu um Papai Noel assim? 80 anos!”. Então, acompanhado por duas funcionárias, retirou-se para uma “pausa”. Ele não mais voltou. Minha filha ficou frustrada por não ter conseguido tirar a foto clássica na poltrona. Ela até conseguiu um registro, mas o contexto não foi nada mágico. Ela sequer teve condições de lhe dizer o que queria de natal.

 Papai Noel é coisa séria. É um personagem sagrado, um emblema para os pequeninos e não deve ser deturpado. Não basta deixar a barba crescer, vestir seus trajes e fazer “ho, ho, ho”. É preciso encarná-lo e, com humildade, lembrar que os menores não querem aquele que se encontra sob as vestes, mas o símbolo, devendo, assim, oferecer o que mais se espera dele: afabilidade, sabedoria, carinho, respeito, generosidade e alegria. Um barbudinho loucão pode até divertir os adultos bêbados de uma pista de dança, mas é uma violação ao imaginário e às expectativas das crianças. Acima de tudo, uma violação ao espírito de natal.

*Imagem: https://www.wallpaperflare.com/search?wallpaper=santa+claus

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A HISTÓRIA DA MINHA VIDA #1: PRÓLOGO

Toda história tem um prólogo. Não é possível imaginarmos que qualquer fato tenha uma origem em si mesmo, sem nenhum motivo anterior. Nem mesmo o universo (e a sua história) vieram do nada: Deus deu o pontapé inicial, e apenas Ele, Deus, não tem uma razão externa para existir, pois é eterno e fora da natureza. Nossa história não começa no nascimento, mas vem de muito antes. Na verdade, seria possível dizer que, caso quiséssemos, sinceramente, elaborar um prólogo fiel de nossas vidas, seria preciso retornar à origem do universo. No entanto, por razões óbvias, se a ideia é criar alguma introdução para a nossa biografia (ou simples livro de memórias), então imagino que o melhor a fazer é limitá-la aos nossos pais, pois são nossas referências biológicas e sociais mais diretas. Minha vida, ou o projeto que se tornaria a minha vida, começou no dia em que meus pais se conheceram, pois ali se encontrava a grande e objetiva propulsão que resultaria, cerca de dez anos depois, no meu enc...

INSPIRAÇÃO, POR ONDE ANDAS?

Como já é possível perceber, estou há muito tempo sem escrever por aqui. Não é apenas por esse canal: eu realmente não mais tenho conseguido palavras para expressar, por meio de textos, meus pensamentos (e garanto que não são poucos!). É interessante que, falando, ou melhor, dialogando com alguém, eu consigo trazer à tona diversas reflexões sobre os mais variados assuntos, mas ultimamente tem sido um sacrifício transportá-las para o "papel".  Estou há poucos dias de férias e resolvi, com o fim de apenas entreter-me, acessar esse meu blog e conferir meus textos antigos. Fiquei impressionado. "Quem é esse que escreve tão bem?", perguntei-me. Sem falsa modéstia, tenho o dom da escrita, ou ao menos tinha, pois parece-me que tal dom "escapou-me pelos dedos", como se o teclado em que digito ou a folha sobre a qual passeia a caneta que venho a empunhar emanassem um sopro de desinspiração, esvaziando a minha mente. "Onde eu estava mesmo...?" é a pergun...

TIA NOECI, HENRIQUE E EU

  Enquanto eu e o Henrique almoçávamos assistindo ao Chaves e ao Chapolin, lá estavas tu, convencendo o meu irmão a, para a comida, dizer “sim”, antes que eu desse cabo aos restos a serem deixados por ele que, diante de uma colher de arroz e feijão, insistia em falar “não”. Enquanto eu e o Henrique estávamos na escola, durante a manhã, na época do Mãe de Deus, tu arrumavas a bagunça do nosso quarto, preparando-o para ser desarrumado outra vez. Então, quando desembarcávamos da Kombi do Ademir, tu, não sem antes sorrir, nos recebias cheia de carinho e atenção, e dava aquele abraço caloroso que transmitia o que havia no teu coração. Enquanto eu e o Henrique, em tenra idade escolar, tínhamos dificuldades nos deveres de casa, tu estavas lá, nos ajudando a ler, escrever e contar, pois, embora a humildade seja tua maior virtude, ela era muito menor do que tua doação. Sabias que, em breve, não mais conseguirias fazê-lo, mas, até lá, com zelo, estenderias tuas mãos. Enquanto eu e o Henri...