Hoje, o governador do Estado do
Rio Grande do Sul, em entrevista ao programa “Gaúcha Atualidade”, da Rádio
Gaúcha, defendeu, mais uma vez, a necessidade de uma Assembleia Constituinte
Exclusiva para a Reforma Política necessária para o país. Engraçado três posicionamentos
adotados por ele nos últimos dias: (i) ser porta-voz dos movimentos sociais em
prol do passe livre; (ii) dizer que o vandalismo é feito apenas por grupos da
extrema direita e "contratados" por estes; (iii) a necessidade
de uma Assembleia Constituinte Exclusiva. Pois bem, não é pouco dizer que sua manifestação revele seu oportunismo político, a incoerência entre suas palavras e ações, além da forma velada como busca espalhar intriga e desconfiança em relação aos pleitos dos protestos que ocorrem pelo Brasil. Isso sem falar na intenção de pular as etapas necessárias, mas legítimas, para implementar reformas na Constituição.
Em relação ao primeiro ponto: uma
semana atrás, o governador mostrou-se receoso a reduzir impostos (ICMS) sobre o
óleo diesel para permitir a redução ainda maior do preço das passagens (uma vez
que a prefeitura de Porto Alegre faria a sua parte), sob o argumento de que
seria necessário verificar a eficácia desta medida, ou seja, se esta redução faria
alguma diferença concreta, objetiva no preço das passagens. Bem, corrijam-se se
eu estiver errado, mas qualquer redução faria diferença, e se essa é a única
medida possível que o Governo do Estado pode fazer para contribuir com a
redução do preço das passagens de ônibus municipais, então que o faça. De todo
modo, é estranho que, uma semana depois, Tarso defenda o passe livre para
estudantes, sob o argumento de que os trabalhadores já recebem esse passe livre
(que seria pago, na verdade, pelos seus empregadores). Ou seja: não há passe
livre, mas alguém paga por isso. Não existe mágica. E, assim, afasta-se o
principal foco de tudo isso, que não é simplesmente o "passe livre",
mas a necessidade de transporte de mais qualidade e a preços mais acessíveis
(diferente de gratuidade, afinal, como já dito, alguém paga por isso, e essa
oneração tem efeito cascata em todo o resto). Vale dizer que tal manifestação
tem nítido caráter oportunista, que visa à aproximação, a todo custo, das
massas, especialmente dos movimentos sociais que as lideram. Sua intenção de
ser "porta-voz” desses movimentos é complicada de digerir. Talvez ele
queira ser porta-voz dos professores em relação ao seu (já miserável) piso
salarial e outras reivindicações da classe mais ignorada do Brasil.
Aproveitando esse parêntese dos
professores, é bom lembrar que Tarso Genro é quem assina a Lei do Piso (Lei
11.738/2008 - http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11738.htm).
No entanto, é ele e o seu governo (assim como o anterior, justiça seja feita)
que não a cumprem. Em abril, uma grande passeata com mais de cinco mil
professores paralisou o centro de Porto Alegre em prol do cumprimento da principal
promessa de campanha do atual governador: pagar o piso do magistério, o que,
inclusive, em muito contribuiu para leva-lo ao Piratini (http://noticias.terra.com.br/educacao/professores-do-rs-pedem-prisao-do-governador-por-nao-pagar-o-piso,de24bfc57083e310VgnVCM4000009bcceb0aRCRD.html).
Enfim, vê-se que Tarso apenas aproveita o momento para angariar votos e apoio.
Cumprir promessas, ainda mais as relacionadas com o anseio das massas, como a
questão do passe livre e da remuneração do magistério, é mero detalhe.
Fechado o parêntese, quanto ao
vandalismo "de direita", posto essa entrevista para que se tirem as
devidas conclusões. Se a edição do jornal mencionado não alterou o teor das respostas,
é de se refletir sobre o ponto de vista de alguns setores da esquerda em
relação ao vandalismo. Na minha opinião, tem de tudo entre os vândalos:
cooptados de todos os lados extremistas (extrema esquerda e direita), para um
acusar o outro depois, e bandidos (sim, eles ainda existem e estão por aí) que
aproveitam o caos para saquear. Na verdade, o que o Tarso quer é demonizar
aqueles que não são "de esquerda". É verdade que há riscos da coisa
desandar, que há extremistas de ambos os lados nas manifestações, e que, na
minha opinião, é errado o ódio aos partidos (que desanda em violência), mas é
irresponsável apontar apenas para um lado o que tem acontecido, sem qualquer
evidência concreta a respeito, mas “teorias da conspiração”. E muitos da
esquerda com quem conversei acham que algumas depredações, especialmente de
órgãos públicos, são justificáveis. E vandalismo é vandalismo de qualquer
jeito, e NUNCA SÃO JUSTIFICÁVEIS num Estado Democrático de Direito em que
existem vias para que as transformações aconteçam sem violência. A seguir, a
entrevista mencionada: http://zerohora.clicrbs.com.br/rs/noticia/2013/06/ha-um-anseio-da-populacao-diz-lucas-marostica-militante-do-coletivo-juntos-4175689.html.
Por fim, a questão da Assembleia
Constituinte Exclusiva (ACE). Para quem não sabe, é uma ideia germinada há
anos, e que, agora, com essas manifestações, o governo quer botá-la em prática
pra valer. Imagino que isso tenha sido o foco do pronunciamento da Dilma quando
ela disse que todo esse movimento propicia a mudança que até agora não foi
possível fazer. Tempos atrás, quando estava em pauta a ACE, ela foi detonada
por muitos juristas, que a entendiam como um golpe (http://ultimainstancia.uol.com.br/conteudo/noticias/23122/30202.shtml.shtml).
A quem serviriam seus interesses? A ideia original, por exemplo, é que a ACE
seria permitida via PEC, e ela possibilitaria que a Constituição fosse
modificada por votos de maioria simples, por exemplo, durante a sua vigência
(da ACE). Isso poderia resultar, simplesmente, em uma outra Constituição velada
de "reformada", como aconteceu na época dos Atos Institucionais,
mesmo que em relação a questões pontuais. E mais: só há duas formas de mudar a
Constituição: via Emenda Constitucional ou via nova Constituição. Quanto às
Emendas, elas não podem visar à mudança da forma como se aprovam Emendas, ou
seja, trata-se de uma cláusula pétrea. No entanto, há quem pense o contrário,
mas, enfim, trata-se de um risco e de uma precipitação que poderia servir a
interesses escusos.
As declarações do Governador do
Estado do Rio Grande do Sul nos possibilitam chegar a três conclusões sobre
suas intenções. A primeira delas é o seu oportunismo político e irresponsável,
afinal, é fácil “entrar na onda do movimento” dizendo amém à reivindicação mais
objetiva em pauta (passe livre aos estudantes de regiões metropolitanas), e
ignorar as consequências econômicas dessa medida (como aconteceu com o caso dos
professores, em que sequer cumpriu o que ele mesmo assinou). Depois, é evidente
a sua busca por polarizar e desunir o povo, com a indicação de que há apenas
uma estirpe político-ideológica e uma intenção por trás do vandalismo que
ocorre nas manifestações, de modo a deslegitimar pleitos que não são
objetivamente de “esquerda”. Por fim, trazer à tona a ideia de Assembleia
Constituinte Exclusiva cheira como um atentado à democracia consolidada,
considerando sua desnecessidade e a possibilidade de realizar as reformas nos limites já existentes no sistema constitucional brasileiro, como
as Emendas Constitucionais. Nossa Constituição é boa, e suas imperfeições podem ser solucionadas pelos mecanismos que ela mesma oferece.
Não sei se havia uma ideia de
agigantar essa onda de manifestações Brasil afora de maneira planejada. Não creio
que haja teoria da conspiração, no que concerne ao início de tudo isso. No
entanto, é fato de que há muitos querendo se aproveitar do momento. Os extremistas
(de esquerda e direita) e os bandidos “profissionais” de plantão, no que toca
ao vandalismo; e os políticos, adotando discursos de última hora com soluções
milagrosas que, se engolidas pela população, poderão trazer consequências
funestas ao Estado Democrático de Direito. Sejamos coerentes e mantenhamos os olhos abertos, sempre com senso crítico.
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