Sim, eu estava lá. Prédio da UNIP, sala 312, bloco A. Mas antes de falar sobre o terrível acontecimento de domingo, 11/11, é necessário que vocês entendam o meu contexto, assim como na série "How I met your mother". Afinal, se um cara pode fazer uma introdução de 8 temporadas para explicar como ele conheceu a mãe dos seus filhos, por que eu não posso gastar algumas letras para que vocês entendam todo o meu sentimento ao sair correndo daquele prédio da UNIP?
A passagem fora comprada com dois meses de antecedência, mas mesmo assim seu valor não era dos mais insignificantes. Definitivamente, não. Do mesmo modo o hotel, cujo quarto já estava reservado há mais de cinquenta dias.
Acordei às 5h da manhã de sábado, dia 10 de novembro de 2012. O avião partiu para o cerrado às 7h40min, e depois de uma longa, mas tranquila viagem, desembarquei em Brasília antes das 10h. Surpreendentemente, estava mais frio na Capital Federal do que em Porto Alegre. Eu deveria ter previsto, afinal, no centro-oeste não existe verão ou inverno, mas estação da chuva e estação da seca, as quais disputam, meio a meio, os meses do ano. Atualmente é tempo de chuva, logo, a temperatura tente a ser mais amena e, dependendo do horário, inclina-se mais para o frio do que para o calor.
Meu hotel era muito bom, não há o que negar. A TV a cabo revelou-se um grande diferencial, assim como o ar condicionado e o travesseiro. O conforto estava garantido, assim como o descanso, e se eu quisesse estudar um pouco, havia uma escrivaninha suficientemente espaçosa para o meu Vade Mecum.
Por estar muito cansado em função do horário em que acordara e da viagem, acabei não estudando quase nada naquela véspera de concurso. Apenas li um pouco da lei mas, fora isso, gastei algumas horas no Pátio Shopping onde comi um whooper e comprei a série completa de "A Caverna do Dragão" (estava em preço promocional, mas confesso que foi um gasto impulsivo), além de uma lembrancinha para a minha noiva (eu precisava compensar a compra do desenho animado de alguma maneira).
Depois de fazer a sesta e ler uma trocentas páginas do segundo volume de "As Crônicas de Artur" (prometo que falo desta trilogia espetacular de Bernard Cornwell em breve), resolvi ir até a Praça das Fontes, em frente à Antena da TV e próxima do maior elefante branco esportivo de toda a História do Brasil, o Mané Garrincha.
A janela do meu quarto tinha vista para esses três pontos turísticos, e pude ver que a praça estava apinhada de gente. Milhares. Sinceramente, pensei que se tratava de uma manifestação, um protesto, uma marcha séria, afinal, naquele mesmo fim-de-semana ocorria, em nossa gloriosa capital, um congresso internacional anti-corrupção. "Puxa, que legal", pensei. "Vou participar deste momento histórico". Entediado do meu isolamento, mas desmotivado para fazer turismo sozinho, resolvi dar uma caminhada de cinco minutos até o local.
Foram cinco longos minutos. Martha Medeiros, exatamente no dia de hoje, escreveu coluna em Zero Hora falando sobre as distâncias existentes em Brasília, que é dividida em setores. Eu estava no setor hoteleiro e, para chegar até a praça, que não era, como já disse, distante mais do que cinco minutos dali, caminhei sem passar por uma viva alma. Na verdade, alguns viciados em crack me cercavam, e cruzei com duas pessoas que estavam com a cara manchada, borrada de preto. "Caras-pintadas", ocorreu-me. "Aqui as coisas acontecem", completei meu pensamento.
Depois de quase ser atropelado no irracional "eixo monumental", que é uma verdadeira auto-estrada em plena cidade, com umas seis pistas e meia dúzia de semáforos, alcancei a praça. Alcancei o inferno.
A praça estava apinhada de gente, mas não era uma reunião política ou coisa assim, mas uma junção de pirralhos fantasiados de zumbis (sim, de zumbis) e que se atracavam. Gurias com menos de treze anos se lambuzavam aos beijos, assim como rapazes da mesma faixa etária. Sério, não sei o que está acontecendo com o mundo, mas só sei que aquelas cenas me chocaram. Ainda mais com a temática assustadora das pessoas, que começaram uma marcha pela região. Onde estavam os pais daqueles piás?
Meu passei acabou frustrado e voltei para o hotel, de só sairia na manhã seguinte. Havia combinado previamente com um taxista (liguei para o cara durante a semana e na véspera), mas ele deu o bolo e me deixou na mão. Ainda bem que não foi difícil arranjar um táxi para ir fazer a prova.
Como estava divertida minha estadia em Brasília.
Enfim, a prova! Tratava-se do concurso para Analista Judiciário, especificamente para o cargo de Execução de Mandados, mas o prédio da UNIP-Brasília, meu local de prova, reunia candidatos para os mais diversos cargos. Eram milhares, somente lá. O edifício, aparentemente novo, parecia em perfeitas condições. Abertos os portões, entrei na minha sala (312, bloco A) e, depois do sinal, eu e todos começamos.
A prova não estava difícil e finalmente havia uma questão dissertativa "respondível". No entanto, nada seria, ao final, respondido. Logo nos primeiros minutos, um grande estalo ecoou pela sala, como se uma pedra tivesse caído do alto de um armário. Uma aluna disse que se tratava de um som oriundo do piso, mas foi ignorada.
Duas horas e meia depois, outro estalo abalou nossa concentração com o teste e foi capaz de nos assustar um pouco. Logo em seguida, mais outro e, então, dois ladrilhos se ergueram e uma candidata deu um grito de susto. Eu e todos nos levantamos. Vimos o que aconteceu e os fiscais nos pediram que continuássemos com a elaboração da prova. Sugeriram que colocássemos as carteiras mais para frente, próximas ao quadro. Enquanto fazíamos isso, seguidos estalos, semelhantes a tiros, emergiram do chão, e a imagem foi apavorante: o chão se erguia em sequência, vindo do fundo da sala em direção à parte frontal, onde estava o quadro. Todos debandamos para fora da sala, mas ainda não havíamos disparado pelo corredor.
Entrei na sala e peguei minha mochila e meus documentos. Enquanto fazia isso, os estalos retornaram com força e aí foi o pânico: todos saíram correndo. Alguns gritavam que o prédio estava ruindo, e isso fez as pessoas das outras salas dispararem, desesperadas em busca da sobrevivência. Eu não parava de orar, e pude ouvir outros fazendo o mesmo. Mais de uma pessoa tombou e foi pisoteada pelos demais, as mesas dos fiscais dos corredores eram derrubadas, algum caíram na escada.
Enfim, cheguei ao lado de fora, longe do edifício e pude respirar aliviado. Estava com minha prova na mão, assim como quase todos ao meu redor. Dezenas choravam, nervosos e assustados. Soube que três pessoas haviam se atirado do prédio. Concedi entrevista para a Globo local e ouvi as histórias dos demais, que não eram da minha sala. Muitos achavam que estava ocorrendo um tiroteio e se atiraram no chão. Outros ficaram alienados até o momento em que um helicóptero pousou ao lado de suas janelas. Alguns, quando perguntavam aos fiscais sobre o que estava acontecendo, eram contemplados com a seguinte resposta: "Nada. Apenas um candidato tentou se suicidar, atirando-se pela janela. Continuem fazendo a prova", até que, claro, um bombeiro aparecia e dizia que o prédio deveria ser evacuado.
Terrível. Um sensação de quase-morte, uma busca instintiva pela sobrevivência, como se fôssemos zebras caçadas por leões. Mas sobrevivemos.
Horas depois seria desvendado que o problema não envolvia risco de desabamento nem nada parecido. Fora apenas uma dilatação dos materiais de construção resultante da variação térmica. Mas vai ter essa frieza em um edifício estranho, aliado à tensão de um concurso público e inflamado pelo pânico dos mais exaltados no momento.
Enfim, o concurso foi cancelado, e as provas da tarde, também. Toda essa minha viagem à Brasília serviu apenas para eu escrever mais uma história de uma viagem à Brasília e ler todo o segundo volume de "As Crônicas de Artur". E um gasto considerável em táxi, passagem e hotel. E hambúrgueres. E "A Caverna do Dragão".
Como quase tudo na vida, quando a gente se dá mal e sobrevive, a história é boa e, nas palavras de Barney Stinson, legen... (just a second...)... DARY (legendária)!
http://g1.globo.com/distrito-federal/noticia/2012/11/tres-pessoas-se-jogam-do-predio-da-unip-apos-tremor-na-estrutura.html
A passagem fora comprada com dois meses de antecedência, mas mesmo assim seu valor não era dos mais insignificantes. Definitivamente, não. Do mesmo modo o hotel, cujo quarto já estava reservado há mais de cinquenta dias.
Acordei às 5h da manhã de sábado, dia 10 de novembro de 2012. O avião partiu para o cerrado às 7h40min, e depois de uma longa, mas tranquila viagem, desembarquei em Brasília antes das 10h. Surpreendentemente, estava mais frio na Capital Federal do que em Porto Alegre. Eu deveria ter previsto, afinal, no centro-oeste não existe verão ou inverno, mas estação da chuva e estação da seca, as quais disputam, meio a meio, os meses do ano. Atualmente é tempo de chuva, logo, a temperatura tente a ser mais amena e, dependendo do horário, inclina-se mais para o frio do que para o calor.
Meu hotel era muito bom, não há o que negar. A TV a cabo revelou-se um grande diferencial, assim como o ar condicionado e o travesseiro. O conforto estava garantido, assim como o descanso, e se eu quisesse estudar um pouco, havia uma escrivaninha suficientemente espaçosa para o meu Vade Mecum.
Por estar muito cansado em função do horário em que acordara e da viagem, acabei não estudando quase nada naquela véspera de concurso. Apenas li um pouco da lei mas, fora isso, gastei algumas horas no Pátio Shopping onde comi um whooper e comprei a série completa de "A Caverna do Dragão" (estava em preço promocional, mas confesso que foi um gasto impulsivo), além de uma lembrancinha para a minha noiva (eu precisava compensar a compra do desenho animado de alguma maneira).
Depois de fazer a sesta e ler uma trocentas páginas do segundo volume de "As Crônicas de Artur" (prometo que falo desta trilogia espetacular de Bernard Cornwell em breve), resolvi ir até a Praça das Fontes, em frente à Antena da TV e próxima do maior elefante branco esportivo de toda a História do Brasil, o Mané Garrincha.
A janela do meu quarto tinha vista para esses três pontos turísticos, e pude ver que a praça estava apinhada de gente. Milhares. Sinceramente, pensei que se tratava de uma manifestação, um protesto, uma marcha séria, afinal, naquele mesmo fim-de-semana ocorria, em nossa gloriosa capital, um congresso internacional anti-corrupção. "Puxa, que legal", pensei. "Vou participar deste momento histórico". Entediado do meu isolamento, mas desmotivado para fazer turismo sozinho, resolvi dar uma caminhada de cinco minutos até o local.
Foram cinco longos minutos. Martha Medeiros, exatamente no dia de hoje, escreveu coluna em Zero Hora falando sobre as distâncias existentes em Brasília, que é dividida em setores. Eu estava no setor hoteleiro e, para chegar até a praça, que não era, como já disse, distante mais do que cinco minutos dali, caminhei sem passar por uma viva alma. Na verdade, alguns viciados em crack me cercavam, e cruzei com duas pessoas que estavam com a cara manchada, borrada de preto. "Caras-pintadas", ocorreu-me. "Aqui as coisas acontecem", completei meu pensamento.
Depois de quase ser atropelado no irracional "eixo monumental", que é uma verdadeira auto-estrada em plena cidade, com umas seis pistas e meia dúzia de semáforos, alcancei a praça. Alcancei o inferno.
A praça estava apinhada de gente, mas não era uma reunião política ou coisa assim, mas uma junção de pirralhos fantasiados de zumbis (sim, de zumbis) e que se atracavam. Gurias com menos de treze anos se lambuzavam aos beijos, assim como rapazes da mesma faixa etária. Sério, não sei o que está acontecendo com o mundo, mas só sei que aquelas cenas me chocaram. Ainda mais com a temática assustadora das pessoas, que começaram uma marcha pela região. Onde estavam os pais daqueles piás?
Meu passei acabou frustrado e voltei para o hotel, de só sairia na manhã seguinte. Havia combinado previamente com um taxista (liguei para o cara durante a semana e na véspera), mas ele deu o bolo e me deixou na mão. Ainda bem que não foi difícil arranjar um táxi para ir fazer a prova.
Como estava divertida minha estadia em Brasília.
Enfim, a prova! Tratava-se do concurso para Analista Judiciário, especificamente para o cargo de Execução de Mandados, mas o prédio da UNIP-Brasília, meu local de prova, reunia candidatos para os mais diversos cargos. Eram milhares, somente lá. O edifício, aparentemente novo, parecia em perfeitas condições. Abertos os portões, entrei na minha sala (312, bloco A) e, depois do sinal, eu e todos começamos.
A prova não estava difícil e finalmente havia uma questão dissertativa "respondível". No entanto, nada seria, ao final, respondido. Logo nos primeiros minutos, um grande estalo ecoou pela sala, como se uma pedra tivesse caído do alto de um armário. Uma aluna disse que se tratava de um som oriundo do piso, mas foi ignorada.
Duas horas e meia depois, outro estalo abalou nossa concentração com o teste e foi capaz de nos assustar um pouco. Logo em seguida, mais outro e, então, dois ladrilhos se ergueram e uma candidata deu um grito de susto. Eu e todos nos levantamos. Vimos o que aconteceu e os fiscais nos pediram que continuássemos com a elaboração da prova. Sugeriram que colocássemos as carteiras mais para frente, próximas ao quadro. Enquanto fazíamos isso, seguidos estalos, semelhantes a tiros, emergiram do chão, e a imagem foi apavorante: o chão se erguia em sequência, vindo do fundo da sala em direção à parte frontal, onde estava o quadro. Todos debandamos para fora da sala, mas ainda não havíamos disparado pelo corredor.
Entrei na sala e peguei minha mochila e meus documentos. Enquanto fazia isso, os estalos retornaram com força e aí foi o pânico: todos saíram correndo. Alguns gritavam que o prédio estava ruindo, e isso fez as pessoas das outras salas dispararem, desesperadas em busca da sobrevivência. Eu não parava de orar, e pude ouvir outros fazendo o mesmo. Mais de uma pessoa tombou e foi pisoteada pelos demais, as mesas dos fiscais dos corredores eram derrubadas, algum caíram na escada.
Enfim, cheguei ao lado de fora, longe do edifício e pude respirar aliviado. Estava com minha prova na mão, assim como quase todos ao meu redor. Dezenas choravam, nervosos e assustados. Soube que três pessoas haviam se atirado do prédio. Concedi entrevista para a Globo local e ouvi as histórias dos demais, que não eram da minha sala. Muitos achavam que estava ocorrendo um tiroteio e se atiraram no chão. Outros ficaram alienados até o momento em que um helicóptero pousou ao lado de suas janelas. Alguns, quando perguntavam aos fiscais sobre o que estava acontecendo, eram contemplados com a seguinte resposta: "Nada. Apenas um candidato tentou se suicidar, atirando-se pela janela. Continuem fazendo a prova", até que, claro, um bombeiro aparecia e dizia que o prédio deveria ser evacuado.
Terrível. Um sensação de quase-morte, uma busca instintiva pela sobrevivência, como se fôssemos zebras caçadas por leões. Mas sobrevivemos.
Horas depois seria desvendado que o problema não envolvia risco de desabamento nem nada parecido. Fora apenas uma dilatação dos materiais de construção resultante da variação térmica. Mas vai ter essa frieza em um edifício estranho, aliado à tensão de um concurso público e inflamado pelo pânico dos mais exaltados no momento.
Enfim, o concurso foi cancelado, e as provas da tarde, também. Toda essa minha viagem à Brasília serviu apenas para eu escrever mais uma história de uma viagem à Brasília e ler todo o segundo volume de "As Crônicas de Artur". E um gasto considerável em táxi, passagem e hotel. E hambúrgueres. E "A Caverna do Dragão".
Como quase tudo na vida, quando a gente se dá mal e sobrevive, a história é boa e, nas palavras de Barney Stinson, legen... (just a second...)... DARY (legendária)!
http://g1.globo.com/distrito-federal/noticia/2012/11/tres-pessoas-se-jogam-do-predio-da-unip-apos-tremor-na-estrutura.html
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