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MORTAL KOMBAT E AS GUERRAS DE ATENA E ARES

 


Em meio a dosadas gotas de sangue e cenas de pancadaria, o filme “Mortal Kombat” (1995) nos presenteia com muitas lições. Raiden, interpretado por Christopher Lambert, é quem mais traz provérbios que, apesar da roupagem oriental, poderiam nos remeter, inclusive, aos ensinamentos da Grécia Antiga.

 A sabedoria impressa pelos gregos em sua mitologia é formidável. Uma das mais interessantes é o contraponto entre Atena e Ares. Ambos são deuses da guerra, porém, bem diferentes. Enquanto aquela é a senhora das chamadas guerras justas, o mal-humorado deus vermelho representa as injustas. A civilização helênica, portanto, não demonizava as guerras, mas o que as motivava.

 Muitas vezes, tende-se a interpretar uma guerra injusta como aquela provocada, enquanto a justa seria a defensiva. Será? Suponhamos que Hitler nunca tivesse saído dos limites da Alemanha ou erguido um dedo contra seus vizinhos, mas, dentro do seu território, feito exatamente o que fez, com campos de concentração, exílios, perseguições e tudo mais. Seria injusto atacá-lo?

 Logo, a justiça da guerra nada tem a ver com lado que ataca ou defende, mas com os princípios que são atacados ou defendidos. Portanto, se um princípio que encarna determinada virtude está sob fogo, um exército poderá marchar em seu nome contra outro, ainda que nenhum tiro tenha rompido os limites de uma fronteira. Porém, um exército virtuoso precisa reconhecer o valor daquilo que defende e assimilar que as coisas boas do seu mundo não surgiram do nada, mas foram construídas a partir de princípios e sacrifícios.

 Assim, quando Raiden, no barco que leva à ilha de Shang Tsung, diz aos seus protegidos que “a essência do Mortal Kombat não é sobre morte, mas sobre vida”, sendo uma luta de homens e mulheres mortais “para salvar seu próprio mundo”, apresenta-se essa ideia de que uma guerra injusta é sobre morte, pois ela procura destruir algo fértil e rico em nome do que é estéril, enquanto a justa é a que envolve o sacrifício em prol daquilo que é valoroso e que traz vida e sentido para essa vida, mesmo que, para tal, seja necessário um ataque.

 Então, será que temos guerreado com justiça em nossas vidas? Indo mais a fundo, estaríamos dispostos a guerrear por algo? O nosso mundo, entendido este como o universo de princípios e valores que são a base do nosso meio familiar, social, espiritual, econômico e cultural, é digno de ser defendido com palavras, unhas e dentes?

 Caso você valorize o mundo em que vive, então a resposta precisa ser sim, sem margem para talvez, pois se o escudo de Atena não for erguido, a lança de Ares não terá piedade.

Imagem: cena do filme "Mortal Kombat" (1995)



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