Acordei naquela manhã de segunda-feira pós-páscoa como a maioria das pessoas provavelmente acordaram naquele dia: com uma grande azia devido ao excesso de açúcar advindo das montanhas de chocolate ingeridas no dia anterior. Resmungando para mim mesmo, desci as escadas da minha casa e chego na cozinha, onde minha mãe e a Tia Noeci conversavam. Dei bom-dia para as duas, mas antes que minha mãe retribuísse a saudação matinal, acabou por comentar espontaneamente a terrível notícia acerca do ocorrido no Sétimo Céu, no bairro Tristeza, em Porto Alegre. Um jovem chamado Tobias fora morto pela própria mãe a tiros, dentro de sua casa.
Na hora, peguei o jornal e verifiquei se esse Tobias era o mesmo Tobias com quem havia convivido treze anos antes, na quinta série do Ensino Fundamental, na Escola Mãe de Deus. Tobias sempre fora mal afamado naquela escola (ao menos quando lá eu estudava). Relatos de que agredira professores eram famosos, bem como eram comuns brigas com a sua participação. Triste era quando aquele guri de onze, doze anos, por motivos estranhos, aparecia na escola com o rosto completamente inchado e cheio de hematomas, dando asas a todo tipo de especulação sobre o que poderia ter causado esses ferimentos. Ele se recusava a falar, e era comum encontrá-lo chorando, na solidão na qual imergia de repente.
Quase que exatos treze anos atrás, na noite de trinta de abril de 1996, estava na festa de aniversário de um grande amigo meu, e nessa festa estava o Tobias. A reunião dançante estava divertida e, como em toda reunião dançante daquela época (ao menos, assim era naquele tempo), havia momentos de música lenta. Recordo-me do Tobias dançando junto a uma de nossas coleguinhas, e naquele momento pude ver tranquilidade no seu rosto. Entretanto, minutos depois, nós o vimos chorando isoladamente. A razão para a queda de suas lágrimas era que ele chegaria muito tarde em casa, e isso era ruim. Muito ruim.
No ano seguinte, fui para outra escola e perdi contato com grande parte dos meus colegas da época do Mãe de Deus. Naquele 1997, deparei-me com o Tobias duas vezes nas ruas do bairro Tristeza, uma andando de skate, sozinho, sem nenhum adulto por perto, e outra de patins. Nunca mais o vi.
O resto sei apenas pela notícia de sua morte: um histórico de uso de drogas, começando pelas mais "leves", até uma das mais mortais e fulminantes: o crack. Os atos de furto e violência foram consequência do uso de drogas e da necessidade desenfreada de obtê-las. Por conseguinte, sentindo a sua vida ameaçada, após inúmeras humilhações e agressões supostamente diante de um perigo iminente, a sua mãe, aquela que o pôs no mundo, acabou por encerrar a vida de seu filho utilizando um revólver de seu marido, pai de Tobias, um colecionador de armas.
Muitos dizem que a principal razão que leva alguém a consumir drogas é a falta de limite que os pais deveriam impôr aos seus filhos e que, na geração dos nascidos nos últimos trinta anos, mais ou menos, restou extremamente abalada. Não sou pedagogo nem sociólogo, mas terei a ousadia de dizer que concordo apenas parcialmente com essa teoria. No caso de Tobias, imagino restar claro que havia, digamos, a imposição de limites para o jovem. Contudo, de nada adianta a imposição de limites se não houver o amor, em primeiro lugar. Sem amor, aquele limite não é real, não é baseado no respeito, mas no temor puro. E quando, por algum motivo, seja físico, econômico ou qualquer outro, não houver mais justificativa para o temor, os limites não são rompidos, mas destruídos, esfacelados. Ainda mais em uma relação familiar. Sem amor, tudo é fracasso.
Paulo dizia que "Poderia ter o dom de anunciar mensagens de Deus, ter todo o conhecimento, entender todos os segredos, e ter tanta fé, que até poderia tirar as montanhas do seu lugar, mas se não tivesse amor, não seria nada. Poderia dar tudo que tinha a até mesmo entregar seu corpo para ser queimado, mas, se não tivesse amor, isso não adiantaria nada" (1Cor 13:2-3). O apóstolo, inspirado por Deus, diz que o amor é maior, inclusive, que a fé (1Cor 13:13). Logo, sempre devemos colocar o amor em primeiro lugar. Incusive na hora de impôs limites e educar os filhos. Sem amor, o limite é mera repressão, só gera o temor. A repressão, sem abuso da violência, é necessária, mas o amor dará a medida ideal para a sua aplicação.
Que o triste fim de Tobias sirva como um exemplo de que o amor é a melhor prevenção contra os males do mundo, e que, sem ele em primeiro lugar, qualquer imposição de limites é vazia.
COMENTÁRIOS
Realmente é muito triste pensar que um cara da nossa idade morre assim...por causa de drogas.O que podemos fazer é refletir para que não ocorra o mesmo com nossos filhos no futuro e para que esse tipo de história (não é a primeira)vire apenas uma lembrança ruim do passado.
24/07/2009 15:28
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