Esse conto possui um final alternativo. Qual vocês acham melhor??
Era apenas mais um dia. O despertador havia tocado às 6h30min, como de hábito. Também como de hábito, tratei de reajustá-lo para as 6h40min, afinal, uma soneca de dez minutos pode influenciar um humor de um dia inteiro. Com os olhos embaçados pela remela criada pelas lacrimações da madrugada, não percebi que programara o despertador para as 7h40min. Dei-me conta somente quando acordei naturalmente às 7h30min. Como se tivesse levado um susto, saltei da cama e tratei de vestir-me. Meia hora depois já estava a caminho do trabalho, atravessando a cinzenta e chuvosa Porto Alegre.
“Detesto sair correndo de casa”, pensei. Realmente, eu detesto. O pior de tudo é não poder ir ao banheiro para deixar o intestino funcionar no horário em que ele se encontra programado para tal. Isso sim influencia o meu humor. No entanto, nada é pior do que o trânsito! Pareço o Pato Donald quando me irrito com as barbeiragens e lentidões do tráfego.
Enfim, cheguei ao meu edifício. O saguão de entrada estava aberto, mas nenhuma luz estava acesa. Voltei-me para a balcão onde ficava o porteiro, mas me deparei apenas com o seu assento vazio e o paletó pendurado no encosto. Devido à chuva e ao vento fortes que açoitavam a cidade, presumi que faltara energia elétrica. O fato de nenhum elevador estar funcionando, aliado ao ruído do gerador que se encontrava ligado, acabou corroborando a minha tese. Não havia opção: subiria pela escada.
A escalada até o 13º andar foi cansativa e sombria. O forte cheiro de óleo diesel e as enfraquecidas luzes de emergência indicavam que o gerador já se encontrava ligado há bastante tempo e sua energia se exauria. Peguei a minha chave, inseri-a na fechadura e destranquei a porta para, enfim, entrar no meu escritório. Para a minha surpresa, a recepcionista estava ausente. No entanto, assim como no caso do porteiro, um suéter se encontrava pendurado no encosto de sua poltrona e indicava que ela havia ido trabalhar. Comecei a achar estranho, afinal, a recepcionista sempre estava lá àquela hora. Como o porteiro também não estava em seu posto, comecei a pensar em bobagens, mas tratei de dispersá-las e parti rumo à minha sala.
"Preciso de sapatos novos", pensei. De fato, os meus se encontravam surrados e o amortecedor estava tão molenga que, a cada passo que eu dava, emitia um som semelhante àquele quando roçamos nossos dedos em um balão. Poderiam notar a minha aproximação a quilômetros de distância! Naquele momento, lembrei-me da minha frustada tentativa em tornar-me um agente secreto da ABIN. Imaginem eu seguindo alguém com esses sapatos? Ainda bem que eu não passei no concurso. Enfim, o único som que se ouvia no escritório era o dos meus sapatos gemendo, além do distante zumbido que se podia ouvir do gerador. O lugar estava completamente vazio, nenhuma luz estava acesa e as portas de todas as salas, trancadas, com exceção da minha. Pendurei o meu paletó no encosto da minha cadeira e fui averiguar melhor os três andares do escritório. Nenhuma secretária, cujas mesas não ficavam em salas, mas nos próprios corredores, estava presente, mas, assim como no caso da recepcionista e do porteiro, seus paletós, casacos ou suéteres se encontravam pendurados nos encostos de suas respectivas poltronas. Tentei usar o telefone profissional para contatar todos os ramais, mas eles não estavam funcionando. Peguei meu celular para ligar para alguns colegas em busca de informações sobre o que estava acontecendo e onde estavam todos, mas o aparelho, misteriosamente, estava fora de área.
Comecei a chamar pelos colegas em alto tom de voz enquanto caminhava pelo lugar, mas tudo o que eu escutava era o gemido do meu sapato velho. Ninguém respondia. Era claro que não havia nenhuma alma lá além da minha, a não ser que fantasmas estivessem vagando pelo escritório. Os advogados poderiam, por algum motivo, estar atrasados, mas a recepcionista e as secretárias, não, assim como o porteiro sempre deveria estar no seu posto. Devido ao mundo louco que nos faz desconfiar de tudo, acabei por relacionar o sumiço do porteiro ao das secretárias. Estaria ele mantendo-as em cativeiro em alguma das salas trancadas? Tudo seria possível.
Resolvi arrombar uma das portas para começar a tirar aquela história a limpo. Quando já havia tomado distância para o violento ato a que eu me dispusera a fazer, meu celular começou a tocar. Não era o toque de uma chamada, mas de um lembrete que eu havia programado na semana anterior. Estava escrito: "Não esquecer de comprar carvão". Acalmei-me, mas senti vergonha de tudo o que acontecera e pensara, e percebi que tinha que descansar mais.
Era domingo.
Resolvi arrombar uma das portas para começar a tirar aquela história a limpo. Quando já havia tomado distância para o violento ato a que eu me dispusera a fazer, ouvi um grito de gol que vinha dos bares da rua. O Brasil jogava pela Copa do Mundo.
Primeiro final é melhor!
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