O
natal de 1993 foi o último em que o Papai Noel me visitou. Foi emocionante,
embora ele não tenha topado me levar para um passeio nas suas renas, afinal,
elas estavam doentes, restando ao barbudinho rechonchudo distribuir presentes pelo mundo a bordo de um velho Passat amarelo emprestado de um amigo seu.
Meses
depois, às vésperas da Páscoa, a professora Daurivete, não sei porquê, falou
aos alunos da sua turma da Terceira Série do Colégio Mãe de Deus, eu entre
eles, que Papai Noel e Coelhinho da Páscoa não existiam. Aquilo foi um choque
para mim. Certo, eu até desconfiava que a história do Coelhinho era um pouco
forçada, mas sempre fui um crente no Bom Velhinho. Defendia sua existência com
unhas e dentes e sempre me exaltava nos debates, tamanha minha convicção.
Porém,
o peso da autoridade da professora era grande e, naquele dia, ao chegar em casa,
recorri a uma instância superior: “Mãe! Diz a verdade: afinal, Papai Noel
existe ou não?”. Ela sorriu piedosamente, fechou os olhos e respondeu: “Filho,
ele existe no nosso coração...” e blá, blá, blá. Uma lágrima solitária escorreu
pelo meu rosto. Não afundei em desespero, mas a decepção foi grande.
Naquela
mesma tarde, compartilhei minha descoberta com alguns colegas da Escolinha de
Futebol Tarciso Gauchito. Embora eu tenha sido o último a encarar tal “realidade”,
não fui zoado. Pelo contrário: muitos aproveitaram para compartilhar suas
histórias individuais a respeito.
Agora
que eu sabia da “verdade”, precisava ser cúmplice da magia em relação ao meu
irmão Henrique, cuja idade ainda lhe permitia acreditar em Papai Noel. Fiz isso
com maestria e nunca cogitei quebrar aquele encanto.
Passaríamos
o natal de 1994 em Nova York. Um sonho de muitos e, no nosso caso, nunca mais
realizado. Seria algo único, como de fato foi. Apesar da expectativa do cenário
literalmente cinematográfico que nos aguardava, sentia-me um pouco vazio, já
que não mais havia a expectativa de ser visitado por Papai Noel.
Poucos
dias antes, estávamos em São Francisco, na Califórnia, passeando por um
shopping center. Entramos em uma loja e me deparei com um extraordinário boneco
do Robocop que encheu meus olhos. Ao mesmo tempo, o Henrique viu uma caixa com
vários bonequinhos do anime Dragon Ball e, como eu, ficou hipnotizado. Nunca tivemos
o hábito de insistir aos nossos pais que comprassem algo e ficamos naquela
sensação meramente contemplativa. Deixamos a loja, o shopping e, pouco depois,
a Costa Oeste dos EUA.
Em
Nova York, enfim chegou a noite de natal. Saímos para jantar em um
restaurante... brasileiro! Pois é, nossa ceia foi um bom e genuíno arroz com
feijão tupiniquim, carne e outras coisas “típicas”. Lembro-me de que foi muito
agradável e divertido. Passeamos a pé por Manhattan, que, embora gelada, não
nos presentou com neve, até que retornamos ao nosso minúsculo, mas bem
localizado, quarto de hotel.
Ao
entrarmos, a surpresa: entre tantos presentes esparramados pela cama, lá
estavam o boneco do Robocop e os bonequinhos do Dragon Ball! Abri um sorriso de
orelha a orelha, extasiado, encantado, perplexo! Meu irmão pulou de alegria e
correu para a cama para pegar aquele presente. Sequer havíamos falado para os
nossos pais daqueles brinquedos, mas apenas entre nós, babando por eles como dois
vira-latas diante do frango sendo assado em uma churrasqueira elétrica exibida
para os clientes. Isso significava que não foram nossos pais que compraram
aqueles presentes, mas o... não, isso não era possível! A verdade havia vindo à
tona e... será?
Meus
pais nunca confirmaram as circunstâncias em que perceberam meu encanto e o de
Henrique por aqueles brinquedos, tampouco o momento em que eles os teriam comprado,
muito menos quando eles foram escondidos e, depois, colocados, junto com outros
presentes, sobre a cama do quarto de hotel. Sempre disseram que foi obra do
Papai Noel. Eu ria, eles também, meu irmão se admirava, mas jamais admitiram
que teriam sido eles.
Por
muito tempo, quebrei a cabeça para juntar as peças que poderiam explicar a
magia daquela noite e, à medida que eu amadurecia, tudo passou a fazer sentido
e cheguei a algumas conclusões lógicas. Porém, quando levadas aos meus pais,
sempre negaram, insistindo que todo o serviço fora realizado por Papai Noel.
Quer
saber? Eles sempre tiveram razão. Afinal, Papai Noel existe nos nossos
corações, inclusive nos corações dos pais que regam esse encanto proporcionado
pelo símbolo do Bom Velhinho. Um encanto que mantém o legado daquele que verdadeiramente vive
no Céu, o Papai Noel original, São Nicolau, que, inspirado pelo nascimento de
Cristo, a razão para celebrarmos essa data, encheu com ainda mais brilho uma
noite brilhante por natureza.
*Imagem: https://www.travelchannel.com/interests/holidays/photos/christmas-in-nyc
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