Duas semanas atrás, Ernesto Araújo, nosso atual
Ministro de Relações Exteriores, concedeu uma entrevista que, até agora,
repercute na mídia, nas redes sociais e nas rodas de conversa: de que o nazismo
seria um fenômeno de esquerda. Tal posicionamento pessoal não foi uma novidade,
já tendo sido apresentado pelo chanceler em outros momentos, inclusive em
artigos, mas agora, uma vez integrante do governo Bolsonaro, sua repercussão é
muito maior, tornando-o alvo de diversas críticas, nacionais e internacionais.
Araújo foi “detonado” pela mídia tradicional e de
maior circulação de nosso país, que repercutiu sua declaração somente a partir
de críticos de tal posicionamento, deixando de ouvir quem porventura com ele
concordasse (e há muitos, tanto no Brasil quanto no exterior). Dias depois, o
presidente Jair Bolsonaro, em visita à Israel, quando o assunto já estava
esquecido, ao visitar o Yad Vashem, o Museu do Holocausto de Israel, deu
combustível à polêmica ao dizer que não teria dúvidas de que “o nazismo é de
esquerda”. Assim como seu Ministro, foi execrado pela grande mídia, e em uma
proporção muito maior.
Assim, o que dizer sobre as declarações de Ernesto
Araújo e Jair Bolsonaro? Afinal, será o nazismo “de esquerda”?
Fomos acostumados a ouvir que o nazismo e o
fascismo foram (e são) movimentos políticos de “extrema-direita”. Logo, segundo
tal visão tradicionalmente promovida, se fôssemos fazer uma linha plana,
colocaríamos em sua ponta mais à direita tais regimes consensualmente malignos
e desumanos. Desse modo, se nossos olhos estão fixados no espectro político mais sombrio de que já se tem conhecimento, não há mais nada pior,
correto? Então, se essa extrema-direita é a última estação antes do inferno, ou
seja, se ela, no reino dos humanos, dos vivos, da realidade material, é a pior
invenção política que poderia existir, só nos resta deslizar nossos olhos para
o outro lado, em busca do que é “menos ruim”. Considerando que estamos olhando
para uma linha reta e plana rabiscada em uma folha de papel, em um quadro de
sala de aula ou em uma lâmina de apresentação de slides, a busca pelo “menos
ruim” (sinônimo de “melhor”) só tem uma direção: a esquerda. Perceberam a
malícia dessa visão gráfica da política?
Por essa visão, a “direita não extrema” (que seria
a “direita” de visão política e cultural conservadora e, no âmbito econômico,
liberal), estaria mais próxima da “extrema-direita”, ou seja, mais próxima dos
agentes do inferno na Terra, do que a esquerda “soft”. Esta, por outro lado,
estaria do lado oposto da linha, do cabo de força da política, separada da
extrema-direita pela “direita light” e mais próxima da extrema-esquerda. Esta,
por sinal, embora igualmente “extrema”, não é abominada ou demonizada, mas, no máximo,
é tão somente evitada ou atenuada. Execrada, jamais, afinal, sua causa seria
justa, sua luta, legítima, mas seus métodos não seriam “adequados”. Portanto, esta
linha reta política míope apresenta dois extremos, da esquerda e da direita,
mas somente o da direita é totalmente demonizado, enquanto o da esquerda, não.
Ao mesmo tempo, tal linha (e as nomenclaturas “direita” e “esquerda”) acabam
influenciando a interpretação das pessoas acerca do que significa ser “de
direita” no sentido light dessa visão. Desse modo, alguém que seja a favor de
visões tradicionais ou de transformações graduais e naturais da sociedade, da
capacidade das pessoas de individualmente serem vetores de tais transformações,
que defendam maior liberdade econômica e
menor intervenção do Estado na vida privada dos seus cidadãos são vistas
como mais próximas da visão nazi-fascista de mundo do que os da “esquerda
soft”, que, em suma, defendem com muito mais afinco a intervenção do Estado nas
mais diversas esferas da sociedade.
Logo, assim como se revelou uma simplificação
dizer que o nazismo e o fascismo foram movimentos de extrema-direita,
simplificação maliciosa que visa a apresentar o lado “mais à esquerda” como o
melhor, enquanto os da direita estariam supostamente mais próximos da face
política mais maligna que já existiu, é igualmente simplista e desonesto
responder o contrário, ou seja, lançar o nazismo e o fascismo para o lado
oposto. Por outro lado, toda a discussão pode ser descomplexificada a
partir do momento em que entendemos no que consiste a visão política nazista e
fascista e qual a sua origem. A partir de então, caso a intenção seja seguir na
maldita e desonesta linha política plana, aí sim será possível colocar o
nazismo e o fascismo mais à esquerda. Todavia, repito: esqueçam essa linha e
atentem à origem do nazismo e do fascismo e sua visão de Estado e de indivíduo.
Ao mesmo tempo, vamos compará-lo à visão política mais à esquerda.
O fascismo é o exemplo italiano de totalitarismo.
Ou seja, se trata de um movimento político-ideológico situado em um contexto de
tempo e espaço, no caso, a Itália da primeira metade do séc. XX, e foi o
próprio Mussolini quem criou a expressão-chave do totalitarismo: “Tudo no
Estado, nada fora do Estado”. Assim como o fascismo, o nazismo é o exemplo
alemão e o comunismo, o russo (que veio a ser exportado para o resto do mundo).
Como características básicas, vemos as seguintes:
1) O totalitarismo envolve grande intervenção
estatal, tratando-se da antítese do liberalismo econômico. Essa intervenção
pode se dar tanto de forma integral (comunismo), em que a propriedade privada é
extirpada dos seus proprietários em favor do Estado, como dirigida (nazismo e
fascismo), em que, embora formalmente não haja essa expropriação, há o controle
sobre a produção, sobre o quanto pode ser lucrado etc. Essa intervenção não se
limita à esfera econômica, atingindo todas as dimensões do indivíduo e da
sociedade, com uma “politização” de todas as áreas da sociedade, como a
família, a religião, os esportes, o trabalho, a cultura etc.
2) Um partido único ou hegemônico. Todos os movimentos
totalitaristas pregavam isso, sendo esse partido hegemônico o detentor de todas
as virtudes, enquanto os demais ou deveriam ser extintos ou deveriam apenas
complementar o grande partido, sem com ele competir. É o caso do partido
Nazistas (“Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães”), do Partido
Fascista, do Partido Comunista russo e por aí vai.
3) O líder intocável. Na Alemanha havia Hitler; na
Itália, Mussolini; na URSS, Stalin; em Cuba, Fidel; na Coreia do Norte, há o
Kim Jong Un, e por aí vai. Esse líder não erra, é perfeito, é o baluarte da
virtude. O objetivo é “encarnar” as virtudes do partido hegemônico.
4) Ditadura do pensamento, havendo o controle
sobre palavras, expressões, distorções entre significados etc. Um exemplo é,
justamente, chamar algum liberal de “fascista”, uma vez que o “fascismo” é
antagônico à ideia de liberalismo econômico. O objetivo é colar uma palavra que
representa algo nefasto a outra que simplesmente vai contra os ideais do
partido. Além disso, a ideia de ditadura do pensamento envolve o objetivo de
evitar a reflexão por parte das pessoas. Oprimidas por não poderem dar o devido
“nome aos bois”, acabam não desenvolvendo esses pensamentos, de modo que a
reflexão é abafada. Exemplo: sujeito é contra cotas raciais porque entende que
a busca pela igualdade deveria se dar de outra maneira, como pelo ensino
público básico. Contudo, a sociedade transmite a ideia de que ser contra cotas
é sinônimo de racista, logo, ele não manifesta publicamente esse pensamento,
deixando de refletir a respeito de soluções alernativas ao problema em questão
(mais negros com educação de qualidade). Esse item também envolve a “reescrita
da história”, como o que ocorre na Coreia do Norte, hoje, onde se diz que o
primeiro ditador deles teria “libertado a Coreia do Japão”, o que nunca
aconteceu.
5) UM INIMIGO, que pode ser uma classe social,
política ou alguma pessoa.
6) A existência de uma milícia ideológica violenta
e extra-estatal, como foram os camisas pardas no Nazismo, os camisas pretas no
Fascismo, a milícia bolivariana na Venezuela, e por aí vai. Essas milícias são
ou criadas ou toleradas pelo partido e pelo Estado, e visam a impor o terror na
população por diversos meios.
Assim, de forma simplificada, percebemos que há
muitos aspectos semelhantes entre o fascismo, o nazismo e o comunismo. Todos
representam visões políticas totalitárias e colocar os dois primeiros no lado
extremo-direito de uma linha, enquanto o comunismo no lado oposto esquerdo é
desonesto. Os três têm muito mais pontos em comum do que o contrário, e até
questões como o antissemitismo são tratados de forma similar.
O fascismo, assim como o comunismo, não era
ideologicamente racista, ao contrário do nazismo. Entretanto, esse racismo se
dava de forma indireta e, nesse sentido, igualmente institucional. Os regimes
comunistas e fascistas perseguem e perseguiam a liberdade religiosa, logo, um
“judeu ateu” não era etnicamente perseguido, mas o era por ser judeu no sentido
cultural. Aqui, colo trecho retirado da obra “A questão judaica”. Palavras de
Karl Marx (disponível em http://www.lusosofia.net/textos/marx_questao_judaica.pdf – p. 33):
“Consideremos o judeu mundano real; não o judeu de sábado,objecto da consideração de Bauer, mas o judeu de todos os dias. Não busquemos o segredo do judeu na sua religião, mas procuremos o segredo da religião no judeu real. Qual a base profana do judaísmo? A necessidade prática, o interesse pessoal. Qual o culto mundano do judeu? A traficância. Qual o seu deus mundano? O dinheiro. Muito bem! Ao emancipar-se do tráfico e do dinheiro e, portanto, do judaísmo real e prático, a nossa época conquistará a própria emancipação.
Uma organização da sociedade que abolisse os pressupostos da traficância e, por conseguinte, a própria possibilidade de traficar, impossibilitaria a existência do judeu. A sua consciência religiosa dissolver-se-ia como um vapor insípido na atmosfera real, tonificante, da sociedade. Por outro lado, quando o judeu reconhece como fútil a sua natureza prática e se esforça por aboli-la, começa a afastar-se da anterior via de desenvolvimento, trabalha pela emancipação humana geral e vira-se contra a expressão prática suprema da auto-alienação humana.”
“Consideremos o judeu mundano real; não o judeu de sábado,objecto da consideração de Bauer, mas o judeu de todos os dias. Não busquemos o segredo do judeu na sua religião, mas procuremos o segredo da religião no judeu real. Qual a base profana do judaísmo? A necessidade prática, o interesse pessoal. Qual o culto mundano do judeu? A traficância. Qual o seu deus mundano? O dinheiro. Muito bem! Ao emancipar-se do tráfico e do dinheiro e, portanto, do judaísmo real e prático, a nossa época conquistará a própria emancipação.
Uma organização da sociedade que abolisse os pressupostos da traficância e, por conseguinte, a própria possibilidade de traficar, impossibilitaria a existência do judeu. A sua consciência religiosa dissolver-se-ia como um vapor insípido na atmosfera real, tonificante, da sociedade. Por outro lado, quando o judeu reconhece como fútil a sua natureza prática e se esforça por aboli-la, começa a afastar-se da anterior via de desenvolvimento, trabalha pela emancipação humana geral e vira-se contra a expressão prática suprema da auto-alienação humana.”
O trecho acima, se fosse proferido pela boca de
Hitler, seria demonizado. Entretanto, quem o fez foi Karl Marx, o teórico do comunismo.
Logo, existem incontáveis interpretações atenuando tal reflexão. O fato é que o
próprio ódio antissemita nazista certamente foi intensificado por tal visão, e
os judeus, nos regimes comunistas e fascistas, também foram perseguidos por
serem, em seu âmago, segundo o próprio Marx, “adoradores” do “deus dinheiro”,
de modo que o Estado visaria a impossibilitar a sua existência como judeus.
Bom, voltando à linha reta dos espectros
políticos, se fôssemos nela situar Karl Marx, então o colocaríamos à esquerda,
correto? Bom, e como encaixar a sua visão acerca da cultura judaica? Na
extrema-direita?
O exemplo acima visa simplesmente a escancarar a
armadilha da visão míope de esquerda X direita e, o que é pior,
extrema-esquerda X extrema-direita. Ao comparar visões de Estado, precisamos
verificar como é essa visão de fato, fugindo dos clichês. De todo modo, ao
denunciar visões como mais ou menos inclinadas ao totalitarismo, é preciso
apontar para a sua inspiração. Logo, por exemplo, partidos cujos líderes
defendam regimes socialistas mundo afora estão defendendo, paradoxalmente,
regimes nazistas e fascistas, porquanto a forma de funcionamento do Estado,
nesses casos, é muito similar.
Ainda que os objetivos manifestados publicamente
nos discursos sejam diferentes (enquanto os nazistas pregavam a superioridade
de sua raça e os fascistas a supremacia de sua nação, os comunistas defendem a
“justiça social” a partir da hegemonia da classe dos trabalhadores sobre a
burguesia – cabendo destacar que os “trabalhadores”, na atualidade, foram
substituídos por “minorias”, enquanto a burguesia o foi pelas “classes
dominantes”), as semelhanças entre seus regimes e métodos são gritantes (alta
intervenção estatal em todas as dimensões da vida do indivíduo e da economia,
ditadura do pensamento, hegemonia de uma visão política, unipartidarismo,
inimigo a ser combatido, o líder intocável – além, é claro, de tais aspectos
estarem fundados em uma ditadura).
Ao mesmo tempo, grupos políticos que defendam
menor intervenção do Estado na economia e na vida social e cultural são o
extremo oposto à ideia de Estado promovida pelos nazistas, fascistas e pelo
próprios regimes socialistas.
Assim, esqueçamos as expressões “esquerda” e
“direita”, pois elas somente tendem a maliciosamente nos levar à confusão. Pensemos
nos aspectos em comum que algumas visões possuem para colocá-las no lado
“nazi-fascista” do espectro político.
Dinesh D’Souza é um indiano naturalizado
norte-americano que hoje é um dos grandes nomes do pensamento
conservador-liberal dos EUA, cujas obras são best sellers por lá.
Em seu livro “The big lie: exposing the nazi
roots of the american left”, de 2017, explica, em suma, que o nazismo é a
expressão alemã do fascismo italiano, e que este último, desenvolvido por
Benito Mussolini, foi elaborado a partir dos pensamentos expressos pelo filósofo
italiano Giovanni Gentile, um socialista que identificou que a “revolução”
prevista por Marx e a ideia de que todas as pessoas deveriam integrar uma única
comunidade, não poderia se dar de forma natural e espontânea, mas a partir de
uma mobilização iniciada por uma elite. Como Marx, ele via o socialismo como
uma condição “sine qua non” para haver justiça social, a fórmula definitiva
para que cada um tivesse o seu justo quinhão. Para Gentile, o fascismo seria
nada mais do que uma forma modificada de socialismo, um socialismo decorrente
não da mera privação material, mas
também de um despertar de uma consciência nacional, um socialismo que une, em
vez de dividir comunidades (D’SOUZA, Dinesh. The big lie: exposing the nazi
roots of the american left. Washington D.C: Regnery Publishing, 2017, p.
53).
Em resumo, em vez de uma sociedade segmentada por
“classes”, estas deveriam se tornar, mediante ação do próprio Estado, uma só,
todas submissas ao Estado, o que inspirou a célebre frase de Mussolini: “Tudo
no Estado, nada fora do Estado”. O autor ainda destaca que fora o próprio
Mussolini que admitiu que fora Gentile a sua inspiração filosófica, e o
pensador ainda serviu como Ministro da Educação do ditador italiano ( The
big lie…, p. 54).
Portanto, considerando que o regime nazista é
inspirado no fascista, cuja origem filosófica remonta a uma “adaptação” do
socialismo, não há surpresa nas similaridades de tais visões políticas: elas
são parentes muito próximas.
“Ei, mas aí está uma contradição: se esse Gentile
apresentava uma ‘adaptação’ do socialismo, então ele não está seguindo à risca
as ideias de Marx. Logo ,ele não poderia ser considerado socialista”, diria um
crítico atento. Sim, talvez, mas se esse critério for adotado, então nenhuma
revolução socialista já ocorrida no mundo teria valor, da russa à cubana, da
chinesa às africanas: todas foram promovidas por elites que forçaram conduziram
o povo a segui-las, e não foi o povo, numa rebelião ampla e geral, como
imaginava Marx. Do mesmo modo, as concepções de “socialismo do séc. XXI”, como
as promovidas pela esquerda norte-americana que vem ocupando espaços do Partido
Democrata, e as ideias bolivarianas promovidas especialmente na Venezuela, na
Bolívia e no Equador seriam igualmente ilegítimas. Ora, tanto o fascismo e o
nazismo quanto o bolivarianismo, para ficar nesses exemplos, são adaptações da
visão marxista de mundo motivadas para serem aplicadas de acordo com aspectos
específicos de tempo e espaço, sob influência de alguma outra corrente
filosófica (como no caso do arianismo, no nazismo, por exemplo). Em suma, é o
que sempre ocorre quando alguma teoria sai dos livros para ser aplicada na vida
prática.
Certo, mas mais alguém dirá: “E os comunistas
perseguidos na Alemanha nazista e na Itália fascista?” Bom, para isso há algumas
respostas. Primeiro, é preciso destacar que, tanto na Itália quanto na
Alemanha, no contexto da crise econômica pós I Guerra mundial, as correntes
socialistas “tradicionais” eram concorrentes das visões nazi-fascistas
justamente pelo fato de que traziam bandeiras muito semelhantes (especialmente
no que concerne às ideias de intervenção do Estado para melhorar a vida da
população) e apresentavam visões de Estado “inovadoras”, diferentes de tudo o
que já se havia visto até então na Europa, sendo ambas, portanto, sedutoras
para os seus combalidos povos. Logo, não poderia haver “alternativa” a uma
visão ou outra, até mesmo em razão da ideia de hegemonia política, cultural e
ao unipartidarismo propagado por tais visões. Em segundo lugar, e especialmente
no que tange à Alemanha nazista, o ódio à União Soviética era motivado não como
um ódio ao comunismo, em si, mas aos judeus e aos eslavos, enfim, às etnias que
integravam os povos da União Soviética e do leste europeu. Um ódio racista, portanto,
e não político.
Além disso, e aí vai um terceiro aspecto, assim
como no campo interno, era importante, no âmbito externo, para os nazistas, não
haver um regime totalitário concorrente, ou seja, não poderia existir qualquer
alternativa. Logo, os nazistas não perseguiam os comunistas por eles serem “de
esquerda”, mas porque o modo como se estruturava seu regime e a sua visão
altamente salvacionista, messiânica e interventora de Estado era concorrente
daquela promovida pelos nazistas justamente em razão de suas semelhanças no que
tange ao funcionamento estatal. Ora, estamos falando de uma disputa interna e
externa por poder e hegemonia, e a rivalidade e o antagonismo militar e
políticos em questão eram motivados por isso. Ademais, a demonização dos comunistas
fazia parte da justificativa para os nazistas expandirem seu terrítório em
direção ao leste, em busca de seu “espaço vital” (o “lebensraum”). Reduzir os
comunistas a uma condição sub-humana, tal qual fizeram com os judeus, integrava
a estratégia nazista de convencer seu povo de que todos os esforços e meios
eram justificáveis para o domínio rumo ao oriente e à escravização ou morte de
quem estivesse no seu caminho.
E então? O nazismo e o fascismo são “de esquerda”?
Diante dessa longa reflexão, estariam Ernesto Araújo e Jair Bolsonaro certos ou
equivocados? No caso, ambos caem na armadilha da régua simplista, tornando-se
vulneráveis às críticas. O fato é que as visões nazistas e fascistas de Estado têm
muitas similaridades com as visões socialistas do passado e do presente, pois todas,
embora sob diferentes justificativas e objetivos publicamente declarados,
apresentam métodos muito semelhantes de difusão, instauração e consolidação.
Todas tendem ao totalitarismo, e todas, segundo diversos pesquisadores, entre
eles o citado Dinesh D’Souza, têm uma origem em comum: o marxismo.
Mesmo assim, é preciso destacar que o binarismo
“esquerda X direita” é destrutivo e nada contributivo, promovendo tão somente a
ignorância. Ele cria uma cortina de preconceito em relação a quem defende
determinadas ideias, rotulando indivíduos de tal forma que acaba por ignorar ou
reprimir posicionamentos independentes sobre pontos específicos. Por exemplo:
uma pessoa taxada como “de direita” seria ignorada se defendesse um sistema de
saúde público e forte, assim como uma “de esquerda” que tivesse uma opinião a
favor da atual proposta de reforma da previdência, ou, ao menos, de alguns ou
muitos de seus pontos. Qual a razão pela qual alguém não poderia ter opiniões
específicas sobre questões específicas? Ainda que essa pessoa tenha em seu
âmago valores que carrega e desenvolveu durante toda a sua existência, tendendo
a, em determinada época de sua vida, inclinar-se mais para um lado ou para o
outro, não teria ela liberdade para se posicionar sobre temas pontuais de
maneira pontual, e não generalista e submetida a uma “ideia maior”?
Portanto, ainda que tecnicamente haja sentido na
constatação acerca da origem comum do nazismo, do fascismo e do socialismo, bem
como da semelhança de suas táticas políticas e de funcionamento do Estado, o
uso da “régua política extrema-esquerda x extrema-direita” é arriscado e
generalista, pois tende a apontar quem possui inclinações políticas mais “à
esquerda” como um Hitler em potencial e vice-versa, empobrecendo o debate
político acerca dos problemas reais a serem enfrentados e em como honestamente
solucioná-los. Por outro lado, fazer referência a tais aspectos em comum são um
ótimo intrumento de defesa para aqueles que, ao apresentarem visões economicamente
liberais e politicamente conservadoras, forem injustamente taxados como
“fascistas”.
Por fim, posto, abaixo, três vídeos de Dinesh
D’Souza que tratam sobre esse tema e resumem aquilo que ele traz em sua obra "The big lie...".
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