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E QUEM VIGIA OS VIGILANTES?




Quis custodiet ipsos custodes?

Assim teria dito o poeta romano Juvenal, que, traduzida do latim, significa "Quem vigia os vigilantes?". E quem são os "vigilantes" de nosso país? Não há Batman, Super-Homem, Vingadores ou Liga da Justiça. O que nos resta?

O "grande vigilante" de nossa sociedade é o Supremo Tribunal Federal. Ele é o guardião da Constituição e dos nossos direitos mais fundamentais. Nada está acima do STF, e dizer o contrário é mero formalismo. Faticamente, não há o que possa tocá-los. Em tese, o Senado tem esse poder, afinal, é quem pode tirar Ministros do pedestal da Corte Máxima por meio do impeachment, mas, ao mesmo tempo, isso poderia significar mexer em um vespeiro, pois cabe ao STF julgar ações de crimes comuns cometidos por parlamentares. Logo, o que existe é como uma "guerra fria", em que ambos os lados detêm "bombas atômicas" em seus silos, as quais, para evitar a aniquilação mútua, não são lançadas e nem têm a perspectiva de sê-lo.

Administrativamente, os próprios membros têm poderes para se fiscalizarem, mas, e especialmente considerando o fato de que são poucos, o caçador de hoje pode ser a caça amanhã. Assim, é mais cômodo ficar cada um na sua, sem, de fato vigiar o outro, salvo algumas censuras públicas feitas para animar a galera que, na prática, não resultam em nada (como Joaquim Barbosa dizendo a Gilmar Mendes que ele "não está falando com os seus capangas do Mato Grosso", ou Luís Roberto Barroso afirmando que o mesmo Mendes era "uma pessoa horrível").

Então, chegamos ao "inquérito das fake news". Aberto pelo Presidente Min. Dias Toffoli em março de 2019, trata-se de uma investigação "para apurar fatos e infrações relativas a notícias fraudulentas (fake news) e ameaças veiculadas na Internet que têm como alvo a Corte, seus ministros e familiares". Conduzido pelo Ministro Alexandre de Morais, já envolveu censura à revista Crusoé pelo fato de ter mencionado Toffoli em reportagem intitulada "O amigo do amigo", e segue a pleno vapor até agora, culminando, no dia de hoje, na operação contra blogueiros, parlamentares e youtubers apoiadores de Jair Bolsonaro. O detalhe é que tal inquérito é totalmente inconstitucional.

Primeiro, não vou entrar no mérito das supostas fake news, em si.Talvez elas existam, e não estou aqui para defender essas pessoas ou o que elas falam. Agora, não cabe ao STF fazer o que está fazendo.

Na notícia de abertura do polêmico inquérito, consta que ele "leva em consideração que é atribuição regimental do presidente da Corte velar pela intangibilidade das prerrogativas do Supremo Tribunal Federal e dos seus membros (artigo 13, inciso I, do Regimento Interno do STF). A abertura de inquérito pelo presidente do STF está prevista no artigo 43 e seguintes do Regimento Interno.".

Mas, então, vamos a esses dispositivos, que colarei na íntegra abaixo:

Art. 13. São atribuições do Presidente: 
I – velar pelas prerrogativas do Tribunal;
(...)
Art. 43. Ocorrendo infração à lei penal NA SEDE OU DEPENDÊNCIA DO TRIBUNAL, o Presidente instaurará inquérito, se envolver autoridade ou pessoa sujeita à sua jurisdição, ou delegará esta atribuição a outro Ministro.
§ 1º Nos demais casos, o Presidente poderá proceder na forma deste artigo ou requisitar a instauração de inquérito à autoridade competente.
§ 2º O Ministro incumbido do inquérito designará escrivão dentre os servidores do Tribunal. Art. 44. A polícia das sessões e das audiências compete ao seu Presidente.
Art. 45. Os inquéritos administrativos serão realizados consoante as normas próprias. (GRIFEI)

Como a questão das "fake news" pode se enquadrar nesses dispositivos? É evidente que eles cuidam de casos ocorridos na sede ou dependência do Tribunal, como está explicitamente escrito, não podendo haver interpretação em sentido diverso. Uma visão diferente, e feita pelos próprios Ministros, é arbitrária, para não dizer o mínimo. Aliás, assim que instaurado o inquérito, houve pedido para o seu arquivamento pela então Procuradora-Geral da República, Raquel Dodge, o que foi negado pelo Supremo. Augusto Aras, seu sucessor, mudou de posição, tendo acesso aos autos da investigação, mas, hoje, já pensa diferente.

Em manifestação feita hoje em parecer nos autos da ADPF n.º 572/DF, Aras pediu a suspensão do inquérito sob a alegação, em suma, de que "a instauração atípica de inquérito judicial pelo Supremo Tribunal Federal não pode ser compreendida com auspícios inquisitoriais".

Enfim, será que o Supremo vai atender ao pedido? Será que o inquérito será, no mínimo, suspenso (deveria ser arquivado)? Ora, não se está negando a investigação em si,  mas quem a faz, em casos como esses, deve ser o Ministério Público ou a Polícia, mas jamais os próprios membros do STF! Isso é um absurdo! Nos casos de ação penal privada ou de questões de responsabilidade civil, deverá o Ministro ofendido buscar os seus direitos, e pelas vias legais. O caso do "inquérito das fake news", por sua vez, é uma anomalia!

O caso de que falei pouco antes, do "amigo do amigo", por exemplo, sequer é uma notícia falsa, mas um relato verdadeiro de um depoimento verdadeiro feito em um processo judicial verdadeiro! Se a informação trazido pela depoente é falsa, que ele responda perante a Lei! Agora, censurar tal notícia é absurdo!

Enfim, voltamos à indagação que abriu essa minha reflexão: "Quem vigia os vigilantes?"  Como não há como nós, de fato, o fazermos, cabe-nos refletir publicamente acerca do que consideramos seus erros. Por isso a importância da liberdade de pensamento e de expressão.

No mais, resta-nos voltarmos os nossos olhos aos céus e, como sabemos que não enxergaremos o Batsinal, orar, pois apenas Deus para nos salvar dessa baderna em que nosso país se tornou. Acima Dele, ao menos, não há STF.








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