Fazia algum tempo que ele batera nas portas das casas de todos da cidade. Alguns o receberam, mas outros, não. Com os primeiros, e não eram poucos, fez grandes amizades, e, no início, todos se lembravam dele, compartilhavam suas alegrias e angústias, convidavam-no para jantar, apreciavam sua companhia. Depois, tudo foi ficando morno, com a maioria se limitando a dar-lhe educados cumprimentos ao acordar e ao dormir. Muitos, nem isso. Outros sequer atendiam às suas ligações e, na rua, ou fingiam não conhecê-lo ou já haviam se esquecido de seu rosto.
Então, no dia do seu aniversário, para retomar laços que outrora se mostravam tão fortes e belos, enviou convites para aqueles que um dia se disseram seus amigos. Comida maravilhosa, decoração impecável, casa limpa e arrumada. Seria uma grande festa! Ao perceber as pessoas se aproximando de sua casa, vibrou, exultante. Antes que batessem à porta, ele já a abriu. Sua alegria, porém, logo começou a ser desfeita, pois algo estava errado.
Os convidados, ao entrarem, apenas cumprimentavam o aniversariante educadamente. Sequer um tapinha nas costas, um afetuoso aperto de mão, uma palavra especial, tampouco um agradecimento pelo convite. Outros nem isso faziam: passavam reto pela entrada da casa e iam direto até a farta mesa de guloseimas ou à geladeira. Em pouco tempo, a casa estava cheia, todos conversavam entre si, mas ninguém se interessava pelo anfitrião. O aniversariante apreciava a alegria dos que recebia, porém se entristecia por se sentir invisível.
Então, uma menininha de 7 anos perguntou ao pai que festa era aquela. Ele respondeu: “Ora, filha, é um aniversário”. “De quem, pai?”, ela questionou. “Ah, filha, não importa. Aproveite a festa. Tem suco na geladeira e salgadinhos na mesa”, ele disse. Ela ficou confusa. Foi quando enxergou, sentado, um senhor que, ao contrário dos outros, que riam, se divertiam, bebiam e conversavam, estava solitário e pensativo.
“Que festa estranha, né?”, ela perguntou. Ele concordou com a cabeça. “Meu pai falou que é um aniversário, mas não disse de quem. Mas eu queria saber. Tudo é tão bonito e especial. Seria legal o aniversariante soprar uma velhinha e ganhar parabéns”. O idoso, então, voltou-se para a criança. “Fico feliz por você pensar assim”. Ela sorriu e percebeu com quem conversava.
Então, quando quase toda a comida e a bebida já haviam se reduzido a farelos e gotas, os “amigos” começaram a partir. A maioria nem se despediu do anfitrião. Alguns poucos se limitaram a um “tchau” seco desprovido de qualquer agradecimento. Ele conhecia muito bem aqueles convidados, sabia como eram seus corações, porém lamentava que aquela amizade inicial, aquele primeiro amor, havia se perdido. Mesmo assim, não desistiria: no ano seguinte, enviaria novos convites.
A menininha, porém, antes de ir embora, abraçou o velho e disse: “Parabéns! Obrigada pela vida do senhor. Ela merece um festão, mesmo!”.
O aniversariante sorriu e pensou: “Ah, se todos fossem como essa criança…”.
*Imagem: "The birth of Jesus Christ", de Andrey Potapov. Fonte: https://www.saatchiart.com/art/Painting-The-birth-of-Jesus-Christ/1083373/6406601/view
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