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BARBÁRVORE E O DIA DA ÁRVORE

 


Como sempre, atravessei o dia 21 de setembro sem conferir aquele asterisco no calendário. Ao buscar minha filha na escola, ela, toda empolgada, disse ter desenhado uma árvore, afinal, era o Dia da Árvore. Abri um sorriso de orgulho e, após assistir a uma aula sobre Tolkien, pensei que seria bom falar sobre uma das partes mais chatas, porém profundas, de “O Senhor dos Anéis” (SdA).

 Em “As Duas Torres”, o capítulo “Barbárvore” foi a grande barreira em minha jornada pela Terra-Média. Monótono e interminável, fez-me ler duas ou três páginas por dia apenas para cumprir sua travessia. O tempo passou, superei o capítulo e segui adiante. Como Merry e Pippin, amadureci. Não, não mudei de opinião e ainda acho o capítulo muito chato. A diferença é que sua chatice é artisticamente bem construída por Tolkien, ilustrando nossa falta de paciência e a relatividade do tempo. O homem moderno vive em ritmo industrial e quer tudo para ontem. Hoje, então, muito mais do que na época do criador da Terra-Média. Seriam nossas decisões sábias o suficiente? Pensamos adequadamente antes de fazer algo? Contemplamos a beleza e a sabedoria do mundo ao redor como ele merece, tocando a criação divina e sentindo seus cheiros e sabores, ou apenas o vemos, mas sem observá-lo, através de janelas envidraçadas e filmes e imagens exibidos nas telas que nos cercam?

 A reflexão de Tolkien, porém, não se limita ao aspecto filosófico do tempo e de sua contemplação, mas também se refere à própria relação do homem com o ambiente. Ele não se opunha ao progresso, mas à sua idolatria hidratada pela arrogância daqueles que detêm o que se julga como alto conhecimento. Saruman era maior do que Gandalf e, mesmo assim, confiando na sua suposta sabedoria, achou que poderia dominar a escuridão ao ignorar a luz da verdade elementar. Enquanto Saruman é o arquétipo da sabedoria corrompida pela arrogância, ansiedade e incredulidade, Barbárvore representa o oposto: sua humildade, paciência e fé mantêm os olhos abertos para o que realmente existe, inclusive para aquilo que é sagrado. Uma vez deparado com a profanação, e devidamente enraizado na verdade, ele se ergue e resiste diante do rompimento dos limites do progresso.

 Passado o Dia da Árvore, o arco de Barbárvore não ensina apenas que a violação desmedida da natureza resulta na sua reação implacável, mas, principalmente, que a verdadeira sabedoria não será encontrada na idolatria daquela já obtida, mas na humildade em admitir que a verdade reside nos elementos mais simples e evidentes da criação. Para tanto, a paciência é fundamental, e ela que permite que decisões sejam tomadas em prol do que é certo e virtuoso, e não em nome do imediato ao custo da corrupção de nossas almas.

 *Imagem: https://www.valinor.com.br/6388

 

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