Quando
lançaram o filme “O Patriota”, estrelado por Mel Gibson, minha mente juvenil
logo se sentiu incomodada com mais uma propaganda ianque. O tempo passou e,
hoje, enxergo aquela grande produção artística com outros olhos. Olhos maduros e
que transcendem explicações simplistas tão facilmente apagadas como o giz do
quadro-negro das salas de aula de minha adolescência.
Apesar
de criticado pelas inconsistências históricas, o filme, assim como “Coração
Valente”, trabalha com a temática do valor da liberdade. A história começa nos
eventos que antecedem o início da Revolução Americana. Em assembleia, colonos
da Carolina do Sul decidem guerrear contra a Inglaterra pela independência. O
personagem de Mel Gibson, o fictício Benjamin Martin, se recusa a lutar e se
abstém de votar a favor da causa, pois é pai e não podia se “dar ao luxo de ter
princípios”, priorizando os filhos e buscando mantê-los longe da luta.
A
abstenção do protagonista não tem qualquer efeito e a guerra é aprovada. Mesmo
pacato e limitando-se a cuidar de feridos, a tirania e a injustiça chegam ao
seu lar, onde seu filho Thomas, ao tentar livrar o irmão Gabriel (Heath Ledger)
de um enforcamento iminente, é baleado. Ele morre nos braços do pai que, apenas
então, e diante de sua casa em chamas, lança-se de corpo e alma na luta pela
independência de seu país contra a tirania do colonizador.
A
Revolução Americana não foi movida por nacionalismo, mas por patriotismo. Pátria vem do latim, patria, que, por sua vez, tem sua origem
em pater (pai), sendo, assim, a terra
dos nossos pais e antepassados, ou seja, a terra com a qual temos um vínculo
histórico e cultural, sendo cultura um conjunto de elementos imateriais e
intangíveis, como idioma, religião, tradições, senso histórico, valores e princípios.
Logo, quando o personagem Benjamin Martin avança contra as tropas inimigas com
a bandeira da nascente nação americana, ele o faz não em nome da abstração de
um país independente, mas em defesa da pátria que aquela bandeira representa. E,
no caso dos EUA, nada se mostrou mais elementar para a sua formação, emancipação,
consolidação, prosperidade, força e influência, nessa ordem, do que a liberdade.
Tenho
pensado muito no mantra #fiqueemcasa. O que há por trás dele? Pois foi isso que
os americanos fizeram até serem surpreendidos em Pearl Harbor, e foi isso o que
personagem Benjamin Martin fez, até que seu filho foi morto em seus braços, e
sua casa, incendiada. A casa de Martin é a sua pátria e, seus filhos, aqueles
que compartilham dessa mesma pátria e do que a compõe, especialmente de seus
princípios elementares. Quando claramente existe uma luta entre um lado e
outro, quando claramente se percebe uma guerra entre aqueles que defendem os seus
princípios e os que o aviltam, ainda que se queira dela se afastar com o fim de
preservar o que nos é mais caro, ela inevitavelmente chegará até nós, até os
nossos queridos, até as nossas casas. Então, aquilo que temos como mais
precioso será roubado, destruído, incendiado, morto.
Não
adianta apenas ficar em casa. É preciso sair, empunhar e tremular as bandeiras
daquilo em que acreditamos, especialmente se ainda somos livres para fazê-lo. Ainda
que as bandeiras revelem, no futuro, um erro, esse erro apenas poderá ser
verdadeiramente encontrado se houver liberdade para essa busca, uma liberdade,
acima de tudo, para os argumentos a favor e contra as ideias defendidas.
Qual
a pátria que queremos? Ela dependerá dos princípios que farão sua bandeira tremular,
e a liberdade está acima de todos, pois permitirá que qualquer ideia se
apresente e que acertos, em meio a tantos erros, sejam revelados. Sem
liberdade, a começar pela de expressão, não há a possibilidade de se aproximar
da verdade, sequer de encontrar o erro, e quanto mais distante da verdade, mais
se está, também, da justiça. Uma justiça nebulosa e longínqua leva à tirania,
uma tirania que não se contentará com abstrações e não descansará até que
tenha, em suas mãos, o temor de nossos corações.
Assim,
se queremos uma pátria livre, verdadeiramente livre, devemos saber que essa
liberdade apenas existirá se concedida igualmente a todos, mesmo que para se
defender algo com o que discordamos. Não há liberdade se ela é restrita aos que
são mais iguais do que os outros.
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