Acabei
de assistir à primeira parte da mais recente temporada de “La Casa de Papel”.
Uma história legal, com muita ação e personagens excelentes e bem construídos.
Porém, o que mais chama atenção na série é a forma como induz, manipula ou, até
mesmo, força o público a torcer pelos bandidos, além da lacração ideológica
explícita. Isso é tão escrachado que me fez pensar se a ideia era transmitir
esses valores ou, justamente, ironizar os valores deturpados com os quais temos
nos deparado.
Apesar
da qualidade inquestionável da atração, eu não consigo torcer por aqueles
ordinários a quem me recuso chamar de mocinhos. São bandidos, ora bolas! A
polícia pode ter, e tem, corruptos e indivíduos que passam dos limites e,
inclusive, cometem crimes. Agora, toda a desgraça da série, desde incalculáveis
prejuízos financeiros ao Poder Público até a restrição da liberdade de
inocentes e a exposição de suas vidas só ocorre porque aquele bando de
criminosos egocêntricos desprovidos de caráter resolveu roubar! Cada morte,
ali, é culpa deles, e não da polícia que não segue as regras daquele “Professor”
tão psicopata quanto inteligente. Esse é o detalhe que, às vezes, não se
percebe.
Talvez a ironia da série esteja justamente na manipulação de toda a história. Ou
seja, temos uma narrativa emocional que busca justificar aqueles atos e chamar
o público para apoiar a quadrilha. Acontece que as histórias individuais de
cada personagem, mesmo que dramatizadas e romantizadas, não poupam os fatos.
Eles são o que são: bandidos que só pensam em ter uma vida boa através de
roubos. O diferente é a maneira como isso é apresentado. É como se Stalin
estivesse passeando por um gulag falando a alguém de sua triste e penosa infância
seguida de diversas atrocidades, tudo por meio de um flashback com filtro
especial, câmera lenta e uma trilha sonora dramática, levando o telespectador a
“entendê-lo”.
A
fim de tornar minha experiência mais confortável, eu sinceramente gostaria que “La
Casa de Papel” representasse uma grande ironia, um certo deboche artisticamente
muito bem feito da cultura deturpada que vem sendo promovida mundo afora. Porém,
não acredito nisso e, realmente, é muito maior a chance de que a série seja
mais uma apologia às mais diversas cartilhas marxistas e que deveria ser, com
justiça, chamada de “Lacrada de Papel”.
Agora,
o que a série tem a ver com os atentados de 11 de setembro de 2001, que hoje
completam 20 anos? Ora, tudo! Afinal, mesmo naquela época se procurou
“entender” o que levou os terroristas a cometerem aquelas atrocidades, algo
que, com o passar do tempo, apenas aumentou. Ainda hoje se procura enxergar
tais ações como uma resposta à “islamofobia”, à intervenção dos EUA no Oriente
Médio e à “terrível” cultura do “american way of life”. Os terroristas são como
Tokyo e companhia, e o Professor é o próprio Osama Bin Ladem. Todos têm
justificativas para os seus atos, e suas histórias, por mais bandidas que
possam ser, se narradas com um bom efeito especial e devidamente dramatizadas,
acabam sendo acatadas pelo público como uma justificativa.
Portanto,
antes de se deixarem seduzir por narrativas bonitinhas e dramatizadas com
trilha sonora épica e romance, lembrem-se daquilo que realmente aconteceu e foi
testemunhado pelos seus olhos. Assim como o narrador da série tenta manipular a
percepção dos fatos que estão ali, diante de nós, o mesmo ocorre em relação aos
eventos que acontecem no cotidiano, e é assim que, infelizmente, há vinte anos buscam
fazer quanto aos atentados de 11/09/2001. A realidade, porém, é inexorável:
inocentes que voavam e trabalhavam foram brutal e injustamente mortos em nome
de um ódio estúpido ao guardião da mais próspera, tolerante e livre civilização
já existente na história.
Nunca
se esqueçam da verdade testemunhada pelos seus olhos, da verdade inquestionável,
dura, fria e resistente como uma rocha, e não se deixem iludir pelas frágeis
narrativas mentirosas de papel, por mais coloridas e perfumadas que possam ser,
pois elas queimam com a menor das fagulhas, se desmancham com apenas algumas
gotas d’água e são levadas pela mais insignificante brisa.
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